sexta-feira, 16 de agosto de 2019

Crónica da corrida na Figueira da Foz...por Sérgio Tente

Foi com enorme expectativa que estive no passado sábado, dia 10 de Agosto na Figueira da Foz para assistir a mais um tradicional espetáculo taurino de verão no Coliseu Figueirense.
Expectativa essa criada acima de tudo pelo facto de no cartel deste espetáculo estar o “meu” grupo de forcados, o Aposento da Moita.

O facto de ainda não ter tido oportunidade de assistir ao vivo a uma atuação do Aposento da Moita nesta temporada de 2019 fazia deste dia um dia particularmente especial já que pessoalmente tinha muita curiosidade em ver como estava o grupo dentro e fora de praça.

Ficou estipulado em conversa com o cabo Leonardo Mathias que o grupo se fardaria em minha casa e esse fator é sempre um enorme motivo de satisfação porque é a melhor forma de podermos criar laços com os elementos que conhecemos menos bem e ver quais as ganas do grupo horas antes de enfrentarem mais uma corrida que neste caso era como as anteriores de enorme responsabilidade.

Um cartel composto por 6 cavaleiros (Rui Salvador, Ana Batista, João Moura Caetano, Andrés Romero, David Gomes e António Prates) e por dois dos melhores grupos de forcados da atualidade (o Grupo de Forcados Amadores de Montemor e o Grupo de Forcados Amadores do Aposento da Moita) frente a um sério curro da ganadaria de Falé Filipe.

Começando a minha crónica propriamente dita recuamos à fardamenta para dizer que senti naquelas cerca de 5 horas antes do inicio da corrida um misto de enorme satisfação por poder estar ali com a rapaziada toda, sentir o que eles sentiam relativamente à responsabilidade da corrida, perceber o ambiente que o grupo tem internamente e também com que “matéria-prima” se rege o grupo atualmente e ao mesmo tempo alguns nervos porque comecei a viver o sentimento de responsabilidade daquela corrida.

Já com o sorteio realizado e com o conhecimento do nosso lote rumámos a casa para começar a reunir todos os elementos e começar o derradeiro foco na corrida. Durante este período e à medida que foram chegando os elementos ativos aproveitei para saber nomes, perceber o estatuto de cada um no grupo, aquilo que habitualmente fazem em praça e foi durante este período que comecei a perceber que existe um ambiente extremamente saudável entre os elementos do grupo. Apesar de se saber já que pegaríamos o maior toiro da corrida não foi isso que fez com que os constantes sorrisos e brincadeiras esmorecessem entre a rapaziada.
Educação, simpatia, noção do que é ser forcado fora de praça com um elevado grau de educação entre mais velhos e mais novos percebi imediatamente que o trabalho do cabo e dos elementos mais velhos estava a ser muito bem feito e este foi o primeiro ponto que me deixou muitíssimo agradado com a postura de todos os elementos.

Na hora de fardar e com a maioria dos forcados ativos presentes proferiu o cabo as palavras que achou serem as mais indicadas para a corrida desse dia e suas caraterísticas. Frisando a entrega de todos naquela que poderia ser uma noite dura já que como sabemos a ganadaria de Falé Filipe pode sair bastante dura e exigente para os forcados. Vi um grupo muito atento às palavras do seu cabo e vi um cabo focadíssimo em ter uma noite de triunfo, pedindo a todos os elementos uma entrega total. Percebia-se pela atitude e pelos olhos de muitos que “bebiam” as palavras do cabo e notava-se uma ansiedade tremenda em que chegasse o momento.

Escolhidos os elementos para se fardarem continuava a reinar uma união muito grande entre todos e percebi aqui que de facto a ideia que tinha do grupo sem ter aparecido era completamente diferente daquilo que via acontecer ali com um grupo que mesmo não tendo uma enormidade de elementos para fardar tinha os elementos suficientes para honrar o Aposento da Moita da mesma forma que muitos outros já o fizeram durante 44 anos da sua história.

Num aparte frisar que achei extraordinário assistir a um ritual que desconhecia de todo que foi depois de já estarem fardados os elementos juntarem-se e rezarem juntos, pura e simplesmente lindo! 
Para a corrida tive o enorme privilégio de ter recebido do Leonardo Mathias um convite para estar na trincheira com o grupo. Aceitei a senha num misto de orgulho, apreensão e responsabilidade já que ali em baixo se passa muita coisa e à que saber lá estar.

Pelas 22 horas começou a corrida com uma moldura humana interessante e expectante por um bom espetáculo de toiros.
Na trincheira vi muita concentração e muita camaradagem. A atenção de todos foi uma constante nos três toiros que nos calharam em sorte assim como aos toiros para o grupo de Montemor o que me encantou já que acho muito importante saber ver e interpretar todos os momentos da lide de um toiro e todas as caraterísticas porque cada toiro é um toiro.

O primeiro toiro que tocou em sorte ao Aposento da Moita acabou por ser o sobrero da corrida já que o primeiro toiro saiu à praça diminuído e foi dada ordem de recolha por parte do diretor de corrida. 
Assim sendo o nosso primeiro toiro foi o sobrero da corrida pesava 450kg, tinha 4 anos e era o único da ganadaria de Santos Silva. Apesar de ter pouca cara e uma córnea bastante pequena este toiro pelo seu comportamento durante a lide prometia dar uma pega bonita. Para a cara deste primeiro toiro o cabo Leonardo Mathias escolheu o Fábio Matos. Desde que saltou para a arena até ter a pega consumada à primeira tentativa o Fábio fez tudo bem. A pega começa desde que se salta para a arena e a forma como ele pisou a arena foi irrepreensível. A atitude que teve frente ao toiro, com postura e a mandar fizeram que os diferentes tempos o fizessem citar, mandar e templar de forma perfeita. Resultou numa pega bonita à primeira tentativa com o grupo a reagir atempadamente e a ajudar bem.

O nosso segundo toiro (quarto da corrida), este já da ganadeira de Falé Filipe era o maior da corrida. Pesava 585kg, tinha também 4 anos de idade e um trapio respeitável. Apesar do seu tamanho e poder este segundo toiro mostrou durante a lide um comportamento interessante e prometia dar um pegão desde que se estivesse bem com ele. Para a cara deste toiro o cabo escolheu o Martim Cosme, forcado que este ano tem feito muito boas pegas mostrando ao cabo que é um elemento que está em grande forma. A sua vontade e maturidade fizeram com que pisasse a arena com ganas de brilhar e de pegar o toiro à primeira. Infelizmente na primeira tentativa quando recuava na cara do toiro acabou por escorregar e cair não tendo a mínima hipótese de consumar aqui a pega. Na segunda tentativa carregou com alma fechando-se bem e tendo sido exemplarmente ajudado pelo Martim Afonso que deu uma primeira ajuda de antologia assim como o restante grupo que ajudou muito bem e concretizou a pega nesta segunda tentativa.
Volta ao forcado da cara e ao primeiro ajuda (merecidíssima) .

O nosso terceiro toiro (sexto e ultimo da corrida) também da ganadaria de Falé Filipe pesava 490kg (na minha opinião tinha mais) tinha também 4 anos e saiu mais reservadote. Durante a lide mostrou bom comportamento e prometia uma boa pega como os demais.
Para este toiro o Leonardo Mathias escolheu o João Gomes que pegou à segunda tentativa. Na primeira tentativa esteve muito bem em frente ao toiro, recuou e fechou-se com alma mas acabou por sair no segundo derrote o que foi uma pena. Na segunda tentativa mais uma vez esteve tremendo em frente ao toiro, pisou terrenos de compromisso e como se costuma dizer esteva algum tempo a ganhar coração já que o toiro tardou em arrancar-se estando já o João muito perto do toiro. Quando o toiro arrancou o forcado da cara sacou-se muito bem e teve uma ótima reunião sendo depois muito bem ajudado pelo grupo.

Foi uma belíssima noite de toiros na Figueira da Foz e o Aposento da Moita realizou sem dúvida uma atuação que honra os seus pergaminhos.

Sem nenhum forcado lesionado (o que é o mais importante) realizou-se o jantar do grupo onde reinou um ambiente de muita alegria o que mostrava claramente o amor que esta geração tem pelo grupo e pela forma como tenta sempre honrar a nossa jaqueta de ramagens.

Presença dos forcados antigos Manuel Duque (ex-cabo), Bernardo Cardoso, José Maria Ferreira e José Henriques e de algumas namoradas de elementos do grupo o que enriquece e muito estes jantares.

Sinto-me extremamente orgulhoso pelo que vi e senti. Grande grupo, grande ambiente!
Pelo Aposento da Moita vai acima….
Sérgio Tente

Fotografias: João Dinis e Monica Mendes

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